A arquitetura se apequena

Texto de Paulo Roberto Barros e Silva, publicado no Jornal do Commercio (Recife, 20 de outubro de 2020):

Em 1980 ao criar o Plano de Preservação de Sítios e Monumentos Históricos do Recife, a Prefeitura consagrava no plano legal a proteção de imóveis exemplares do patrimônio histórico, bem como de áreas históricas expressivas localizadas no Bairro do Recife, em partes de Santo Antônio, São José, Boa Vista e outras. Na oportunidade nasciam os Imóveis Especiais de Preservação (IEPs), assim denominados "aqueles cuja proteção é dever do município e da comunidade, nos termos da Constituição Federal e da Lei Orgânica Municipal". E junto com eles, uma questão hoje recorrente: para o proprietário do bem preservado e protegido sobrariam os custos de manutenção e a impossibilidade de usos à semelhança de imóveis na sua vizinhança. Evidencia-se assim um efeito perverso sobre a responsabilidade benfeitora do município e da comunidade para com o patrimônio. Assim é a legislação bem intencionada, porém ineficaz e injusta. Em 1980 tentamos introduzir a figura do solo criado, que corresponde ao espaço aéreo sobre o terreno do que pode ser edificado. O prefeito Gustavo Krause até que tentou, mas a adoção  do solo criado ainda era inconstitucional. 

O tempo passou e as centenas de imóveis e dezenas de sítios que foram preservados na lei, foram sendo tombados no cotidiano posto que a palavra incentivo foi banida da legislação urbanística. Entretanto, o Estatuto da Cidade, de 2001, contemplou na criação da Transferência do Direito de Construir (TDC), a alternativa legal para se promover a um só tempo, a preservação e a justiça social. A TDC é o solo criado incorporado ao urbanismo. Em 2018 a ADEMI e o SINDUSCON propuseram à Prefeitura do Recife uma minuta de projeto de lei para regulamentação da TDC, com ênfase nos imóveis especiais de preservação (IEPs e imóveis especiais de proteção de área verde - IPAVs), visando assegurar eficácia aos dois instrumentos, tanto para a cidade quanto para o proprietário dos bens a serem protegidos.

A proposta não foi adiante. No novo Plano Diretor em debate na Câmara, ai incentivo possível se incorporou a burocracia do não fazer e quando fizer, de ganhos monetários para os cofres municipais.

Os lamentáveis eventos de demolições de imóveis que mereciam ser preservados para a cidade vão continuar enquanto os cidadãos e governantes não atentarem para os proprietários dos bens notáveis que merecem ser protegidos. Neste caso já tombaram pelo tempo e ou foram reformados "na marra". Os instrumentos existem há 20 anos. Os governantes não estão não estão nem aí para o choro e velas do pós vida do patrimônio que a cidade deveria cuidar. Perdoem mestres Delfim Amorim e Vital Pessoa de Melo, pois a arquitetura do recife se apequena diante da inépcia de todos nós.

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